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Promessa de doação do salário de Prefeito a ONG não é compra de voto

Promessa de doação do salário de Prefeito a ONG não é compra de voto

[05/02/2013]

Em sentença publicada na data de hoje (05.02.13), o Juízo da 19ª Zona Eleitoral de Santa Catarina - Joinville julgou improcedente Ação de Investigação Judicial, entendendo que o atual prefeito da cidade não promoveu captação ilícita de sufrágio nas eleições 2012.


Entenda o caso: Durante o período de propaganda eleitoral no segundo turno das eleições 2012, um dos candidatos a Prefeito declarou que, se eleito fosse, doaria seu salário a entidades assistenciais.


Durante a campanha não houve insurgência quanto a este fato.


Apenas às vésperas da diplomação dos eleitos (meados de dezembro/2012) o candidato derrotado nas urnas ajuizou a AIJE alegando que aquela promessa de campanha seria, em verdade, captação ilícita de sufrágio.


O pedido liminar para suspender a diplomação foi indeferido e ação julgada improcedente em 1ª instância.


É possível a interposição de recurso dirigido ao Tribunal Regional Eleitoral.


Aos interessados, o inteiro teor da sentença está disponível abaixo:


 


Autos n. 600-69.2012.6.24.0019


Representante: Clarikenendy Nunes


Representados: Udo Dohler; Rodrigo Coelho


CLARIKENNEDY NUNES ajuizou a representação contra o Prefeito eleito do Município de Joinville e seu vice-prefeito, respectivamente UDO DOHLER e RODRIGO COELHO, alegando que os eleitos apenas tiveram sucesso no pleito porque, poucos dias antes do escrutínio final, o primeiro requerido em convocação da imprensa anunciou a promessa de doar salário de alcaide, caso eleito, a atividades comunitárias relevantes. Aduz que o anúncio dessa atitude, embora louvável, foi feita com estardalhaço e às vésperas do pleito, envolvendo assim abuso de poder econômico e corrupção (ou captação ilícita de sufrágio), pois revela compra de votos dos eleitores de alguma forma ligados às entidades de assistência social, praticando ações vedadas pelos artigos 41-A da Lei 9.504/97 e art. 299 do Código Eleitoral. Requer a declaração de nulidade do pleito, cassação do mandato eletivo e a diplomação, nomear o requerente, segundo colocado no pleito, como vencedor ou, alternativamente, convocadas novas  eleições, com pedido liminar de suspensão da diplomação dos eleitos.


A liminar foi negada na decisão de fls. 77/80.


Notificados, os representados defenderam-se, alegando preliminarmente decadência do direito, visto que a representação, sob o fundamento de captação ilícita de sufrágio, somente poderia ser intentada antes da diplomação, o que não ocorreu por completo, eis que a inicial foi emendada pelo requerente quatro dias após. No mérito, aduziram que promessas de campanha, como aquela noticiada na inicial, não podem ser consideradas como compra de votos, eis que não destinadas a eleitor específico, além do que a notícia da promessa foi veiculada dentro do prazo legal da propaganda eleitoral. Se assim não fosse, aduzem que qualquer promessa de campanha poderia ser considerada irregular, eis que sempre contemplam o benefício a algum setor da sociedade, como por exemplo o próprio requerente fez quando prometeu entrega domiciliar de remédios aos idosos. E que o abuso de poder econômico apenas se verifica quando há desarrazoada utilização de recursos materiais e financeiros, para fins de propaganda, que atenta contra a isonomia dos candidatos, o que não se vislumbra no caso, ao contrário deveria servir de exemplo aos políticos.


O Ministério Público Eleitoral, por fim, opinou pela rejeição da preliminar de decadência e concluiu que não se encontra demonstrada a prática dos atos vedados ao candidato, em consonância com as alegações da defesa.


É o relatório, pelo que passo a decidir.


A matéria a ser enfrentada não depende de prova, pois é eminentemente de direito, restando a matéria de fato suficientemente demonstrada pelas partes por documentos, razão pela qual julga-se o pedido no estado em que se encontra, independente de instrução probatória.


Antes de tudo, razão assiste ao Ministério Público Eleitoral quando opina pelo não conhecimento da alegada decadência do direito postulatório, eis que efetivamente a ação foi proposta antes da diplomação dos eleitos.


A fundamentação legal do pedido inicial é, sobretudo, aquela constante no artigo 41-A e § 10, da Lei 9.504/97, que trata das condutas vedadas aos agentes públicos em campanhas eleitorais, além da captação ilícita de sufrágio. Nessas hipóteses, em caso de procedência do pedido, as penas culminadas são aquelas previstas nos §§ 4º e 5º da referida Lei, qual seja a suspensão imediata da conduta vedada, quando for o caso, além da imposição de multa e cassação do registro ou diploma.


No campo das condutas vedadas, recomendável que a Justiça Eleitoral, à vista do fato, de sua gravidade e de sua repercussão no processo eleitoral, aja com prudência, cautela e equilíbrio, mas sempre tendo o devido cuidado para que não haja alteração da própria vontade popular. E conclui-se que não há a conseqüência pretendida da cassação do diploma, como inclusive já se antevera na decisão da eminente colega, titular desta Zona Eleitoral, que indeferiu o pedido liminar, pois como bem ponderaram os representados e o Ministério Público Eleitoral, efetivamente não se procurou captar sufrágio ilicitamente ou agiu o agente público em campanha de forma vedada por lei.


Afinal, com efeito não se pode considerar como intenção de compra de voto, ou muito menos como abuso de poder econômico, a manifestação de vontade de doação de salários, posto que não dirigido a um eleitor ou grupo de eleitores específicos e nem tampouco sem qualquer referência a pedido de voto por isso. Se assim não fosse, sepultada estaria qualquer campanha eleitoral, onde via de regra os candidatos prometem melhorias em determinados setores da administração pública, que invariavelmente viria a beneficiar um segmento social.


Interessante notar, nesse particular, que documentação acostada à própria inicial, consistente em matéria jornalística estampada no Diário Catarinense de 25/10/12, onde se noticia que a promessa de doação do salário virou tema da campanha eleitoral, revela que o referido periódico contatou o Representante a respeito, havendo esse declarado que faria o mesmo se fosse milionário, inclusive taxando a atitude de louvável, e que tal promessa, se concretizada, "não mudará a vida de nenhuma pessoa em Joinville" (fl. 76). O espírito da vedação legal invocada, aquela do artigo 41A da Lei 9.504/97, é exatamente coibir qualquer vantagem pessoal a algum eleitor determinado, em troca de votos, pois o que se veda é a promessa de indevida vantagem, com o consequente desequilíbrio do pleito, posto que isso confere maiores e melhores condições a um candidato.


Mas nada disso se infere da conduta impugnada.


Destaque-se ainda que essa intenção genérica, aquela da promessa de doação de seu salário, foi diferida para o futuro, conferindo um atributo nítido de que, se eleito o candidato, tem ele o objetivo de cumprir a promessa. Trata-se, portanto, de ato do governo a ser praticado no futuro. Julgado expressivo do colendo Tribunal Superior Eleitoral vem a confirmar a tese aqui sustentada:


"As promessas genéricas, sem o objetivo de satisfazer interesses individuais e privados, não são capazes de atrair a incidência do art. 41-A da Lei nO9.504/97" (TSE, Acórdão nº 5.498/SP, rel. Min. Gilmar Mendes, DJ de 28.10.2005).


A toda evidência, promessas genéricas de campanha, como por exemplo também a realização de obras públicas e a inclusão de reivindicações de obras públicas em programa de governo, não caracterizam o ilícito dardejado pelo art. 41-A da Lei das Eleições. E para a caracterização de abuso de poder econômico tem que ser comprovado dispêndio irregular de recursos financeiros em campanha eleitoral, sejam públicos ou privados, o que absolutamente não se demonstrou no caso concreto. De fato, promessa de campanha naquele sentido não determina a incidência do disposto no art. 41-A da Lei 9.504/97, que claramente se refere à "vantagem pessoal". Se a promessa se relacionar com benefício a ser obtido concreta e individualmente por eleitor determinado, aí sim há de aplicar o disposto no aludido dispositivo legal. A promessa de vantagem pessoal em troca de voto é parte da faftispecie integrante da norma. Sem isso, inviável é a representação. Julgo, assim, improcedente o pedido.


P.R.I.


Joinville, 31 de janeiro de 2013


Décio Menna Barreto de Araújo Filho


Juiz da 19ª Zona Eleitoral e. e.


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