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A atuação do STF pós confronto público entre Ministros

A atuação do STF pós confronto público entre Ministros

[22/04/2012]

É destaque nacional a rixa existente entre dois Ministros do principal Tribunal do país, o Supremo Tribunal Federal.


Joaquim Barbosa e Cézar Peluso se atacaram mutuamente esta semana através da imprensa.


Barbosa chegou a adjetivar Peluso de 'ridículo', 'brega', 'desleal', 'tirano' e a acusá-lo de manipular julgamentos. Abaixo trazemos a reportagem da Agência O Globo, com a entrevista do ministro Barbosa.


Peluso, por sua vez, atacou o Ministro Barbosa chamando-o de inseguro e dono de temperamento difícil.


Ambas as declarações são extremamente infelizes e possuem reflexos na atuação do STF.


E agora, como ficará a Corte?


O cargo de Ministro do STF é vitalício. Não existe mandato de 2, 4, 10 anos. Uma vez Ministro, fica-se lá até o fim de sua vida ou até a aposentaria (com 70 anos de idade).


Sabendo que Peluso é nascido em 03.09.1942, será possível uma convivência harmoniosa entre eles durante os próximos 4 meses?


Sinceramente, acredito que não. O que foi dito publicamente, de ambos os lados, reflete não apenas um inconformismo pontual, mas sim uma profunda ausência de respeito mútuo.


São acusações graves, relativas à seara do caráter de cada qual.


O atual Presidente da Corte, Ministro Ayres Britto tenta minimizar o estrago, dizendo que "considera impossível haver manipulação no resultado de julgamentos durante as sessões."


Porém, apesar deste sentimento pessoal do Presidente, não seria o caso de abrir uma investigação para apurar a denúncia?


Não se pode permitir qualquer margem para dúvidas quanto à lisura das decisões da nossa Suprema Corte.


Por outro lado, é aconselhável que assuma a Presidência do STF uma pessoa que simplesmente acusa em rede nacional um de seus pares, sem que requeira a dotação de medidas para apurar e punir estas condutas?


Infantilidade, prepotência ou simples saturação em ver condutas que considera inaceitáveis?


A par disso tudo, como ficarão os nossos processos? Em casos polêmicos, em que o voto de um poderá ser debatido, apoiado ou rejeitado pelo outro, é possível se imaginar que teremos posicionamentos apenas relacionados com o caso ali apreciado, sem que os Ministros levem em consideração a imagem desabonadora que nutrem um pelo outro?


Neste caso, me parece que o respeito mútuo não existe e não existirá nunca mais.


Sendo assim, é possível permitir a convivência entre ambos, mesmo que por poucos meses? Não podemos esquecer que nas mãos destes nobres Ministros estão causas importantes para a nação (o mais emblemático de todos é o caso do Mensalão) e que precisam ser tratadas com imparcialidade. Porém, não são máquinas - continuam sendo serem humanos e lhes é permitido decidir de acordo com seus sentimentos e vivências pessoais.


Porém, o simples desafeto entre os julgadores, me parece, deveria ser desconsiderado durante os pronunciamentos e decisões que fizerem durante o exercício de suas funções. Será possível enobrecer o espírito a ponto de deixar de lado as querelas pessoais para decidir com imparcialidade o futuro jurídico da nação?


 


REPORTAGEM DE CAROLINA BRÍGIDO - AGÊNCIA O GLOBO - 20.04.2012


"Joaquim Barbosa diz que Peluso manipulou resultados de julgamentos


BRASÍLIA - Dois dias depois de ser chamado de inseguro e dono de "temperamento difícil" pelo ministro Cezar Peluso, o ministro do Supremo Tribunal Federal Joaquim Barbosa respondeu em tom duro. Em entrevista ao GLOBO, Barbosa chamou o agora ex-presidente do STF de "ridículo", "brega", "caipira", "corporativo", "desleal", "tirano" e "pequeno". Acusou Peluso de manipular resultados de julgamentos de acordo com seus interesses, e de praticar "supreme bullying" contra ele por conta dos problemas de saúde que o levaram a se afastar para tratamento. Barbosa é relator do mensalão e assumirá em sete meses a presidência do STF, sucedendo a Ayres Britto, empossado nesta quinta-feira. Para Barbosa, Peluso não deixa legado ao STF: "As pessoas guardarão a imagem de um presidente conservador e tirânico, que não hesitava em violar as normas quando se tratava de impor à força a sua vontade."


O GLOBO: Ao deixar o cargo, o ex-presidente do STF, ministro Cezar Peluso, deu entrevista na qual citou o senhor. Em um dos momentos, diz que o senhor não recusará a presidência do tribunal em circunstância alguma. É verdade?


JOAQUIM BARBOSA: Para mim, assumir a presidência do STF é uma obrigação. Tenho feito o possível e o impossível para me recuperar consistentemente e chegar bem em dezembro para assumir a presidência da Corte. Mas, para ser sincero, devo dizer que os obstáculos que tive até agora na busca desse objetivo, lamentavelmente, foram quase todos criados pelo senhor... Cezar Peluso. Foi ele quem, em 2010, quando me afastei por dois meses para tratamento intensivo em São Paulo, questionou a minha licença médica e, veja que ridículo, aventou a possibilidade de eu ser aposentado compulsoriamente. Foi ele quem, no segundo semestre do ano passado, após eu me submeter a uma cirurgia dificílima (de quadril), que me deixou vários meses sem poder andar, ignorava o fato e insistia em colocar processos meus na pauta de julgamento para forçar a minha ida ao plenário, pouco importando se a minha condição o permitia ou não.


O senhor tomou alguma providência?


BARBOSA: Um dia eu peguei os laudos descritivos dos meus problemas de saúde, assinados pelos médicos que então me assistiam, Dr. Lin Tse e Dr. Roberto Dantas, ambos de São Paulo, e os entreguei ao Peluso, abrindo mão assim do direito que tenho à confidencialidade no que diz respeito à questão de saúde. Desde então, aquilo que eu qualifiquei jocosamente com os meus assessores como "supreme bullying" vinha cessando. As fofocas sobre a minha condição de saúde desapareceram dos jornais.


Qual a opinião do senhor sobre a entrevista dada por Cezar Peluso?


BARBOSA: Eis que no penúltimo dia da sua desastrosa presidência, o senhor Peluso, numa demonstração de "désinvolture" brega, caipira, volta a expor a jornalistas detalhes constrangedores do meu problema de saúde, ainda por cima envolvendo o nome de médico de largo reconhecimento no campo da neurocirurgia que, infelizmente, não faz parte da equipe de médicos que me assistem. Meu Deus! Isto lá é postura de um presidente do Supremo Tribunal Federal?


O ministro Peluso disse na entrevista que o tribunal se apaziguou na gestão dele. O senhor concorda com essa avaliação?


BARBOSA: Peluso está equivocado. Ele não apaziguou o tribunal. Ao contrário, ele incendiou o Judiciário inteiro com a sua obsessão corporativista.


Na visão do senhor, qual o legado que o ministro Peluso deixa para o STF?


BARBOSA: Nenhum legado positivo. As pessoas guardarão na lembrança a imagem de um presidente do STF conservador, imperial, tirânico, que não hesitava em violar as normas quando se tratava de impor à força a sua vontade. Dou exemplos: Peluso inúmeras vezes manipulou ou tentou manipular resultados de julgamentos, criando falsas questões processuais simplesmente para tumultuar e não proclamar o resultado que era contrário ao seu pensamento. Lembre-se do impasse nos primeiros julgamentos da Ficha Limpa, que levou o tribunal a horas de discussões inúteis; não hesitou em votar duas vezes num mesmo caso, o que é absolutamente inconstitucional, ilegal, inaceitável (o ministro se refere ao julgamento que livrou Jader Barbalho da Lei da Ficha Limpa e garantiu a volta dele ao Senado, no qual o duplo voto de Peluso, garantido no Regimento Interno do STF, foi decisivo. Joaquim discorda desse instrumento); cometeu a barbaridade e a deslealdade de, numa curta viagem que fiz aos Estados Unidos para consulta médica, "invadir" a minha seara (eu era relator do caso), surrupiar-me o processo para poder ceder facilmente a pressões...


Quando o senhor assumir a presidência, pretende conduzir o tribunal de que forma? O senhor acha que terá problemas para lidar com a magistratura e com advogados?


BARBOSA: Nenhum problema. Tratarei todos com urbanidade, com equidade, sem preferências para A, B ou C.


O ministro Peluso também chamou o senhor de inseguro, e disse que, por conta disso, se ofenderia com qualquer coisa. Afirmou, inclusive, que o senhor tem reações violentas. O senhor concorda com essa avaliação?


BARBOSA: Ao dizer que sou inseguro, o ministro Peluso se esqueceu de notar algo muito importante. Pertencemos a mundos diferentes. O que às vezes ele pensa ser insegurança minha, na verdade é simplesmente ausência ou inapetência para conversar, por falta de assunto. Basta comparar nossos currículos, percursos de vida pessoal e profissional. Eu aposto o seguinte: Peluso nunca curtiu nem ouviu falar de The Ink Spots (grupo norte-americano de rock e blues da década de 1930/40)! Isso aí já diz tudo do mundo que existe a nos separar...


O senhor já protagonizou algumas discussões mais acaloradas em plenário, inclusive com o ministro Gilmar Mendes. Acha que isso ocorreu devido ao seu temperamento ou a outro fator?


BARBOSA: Alguns brasileiros não negros se acham no direito de tomar certas liberdades com negros. Você já percebeu que eu não permito isso, né? Foi o que aconteceu naquela ocasião.


O senhor tem medo de ser qualificado como arrogante, como o ministro Peluso disse? Tem receio de ser qualificado como alguém que foi para o STF não por méritos, mas pela cor, também conforme a declaração do ministro?


BARBOSA: Ao chegar ao STF, eu tinha uma escolaridade jurídica que pouquíssimos na história do tribunal tiveram o privilégio de ter. As pessoas racistas, em geral, fazem questão de esquecer esse detalhezinho do meu currículo. Insistem a todo momento na cor da minha pele. Peluso não seria uma exceção, não é mesmo? Aliás, permita-me relatar um episódio recente, que é bem ilustrativo da pequenez do Peluso: uma universidade francesa me convidou a participar de uma banca de doutorado em que se defenderia uma excelente tese sobre o Supremo Tribunal Federal e o seu papel na democracia brasileira. Peluso vetou que me fossem pagas diárias durante os três dias de afastamento, ao passo que me parecia evidente o interesse da Corte em se projetar internacionalmente, pois, afinal, era a sua obra que estava em discussão. Inseguro, eu?


O senhor considera que Peluso tratou seu problema de saúde de forma desrespeitosa?


BARBOSA: Sim.


O senhor sofre preconceito de cor por parte de seus colegas do STF? E por parte de outras pessoas?


BARBOSA: Tire as suas próprias conclusões. Tenho quase 40 anos de vida pública. Em todos os lugares em que trabalhei sempre houve um ou outro engraçadinho a tomar certas liberdades comigo, achando que a cor da minha pele o autorizava a tanto. Sempre a minha resposta veio na hora, dura. Mas isso não me impediu de ter centenas de amigos nos quatro cantos do mundo."


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